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repórter
18 octobre 2006

Um domingo sem história


Dia agradável, embarco no comboio, rumo a Espinho. A viagem, no suburbano com partida de São Bento às 16h10, decorre sem percalços.

 

Em Espinho, inevitável, a marginal. Tarde de domingo a propor óculos de sol, variada oferta a roçar os pés dos transeuntes: formigueiro a passear para a frente e para trás. Na barafunda, ciclistas acrobáticos, alçados sobre o selim. E o mar, picado, a arremessar-se contra a costa; o mar a morder tão perto. Cerveja na esplanada, todo o mundo a olhar para longe.

 

Viro costas. Curtas deambulações na cidade, algumas fotografias. Fustigado pelo vento, regresso: suburbano das 18h30, partida à hora certa.

 

Granja, Aguda, no apeadeiro de Miramar decido-me por uma surtida em terra. Plano simples: tirar uma fotografia da plataforma e reentrar. Por um segundo, falho os cálculos.

 

Quando, a próxima ligação? Busco apoio no longo correr edificado, evidência da importância deste destino no passado. Hoje, as portas, as janelas, as bilheteiras, os lavabos, tudo fechado. Neste espaço, nem vivalma. Nas paredes, gatafunhos, inscrições, desenhos de cores berrantes. Embrulhado em fita adesiva e papel pardo, cego ao tempo, o relógio.

 

Ocorre-me o pesadelo da estação de Barca de Alva, o abandono de linhas, o fecho de ramais por aí, em prejuízo das pessoas, do desenvolvimento. Mas Miramar, eixo Porto - Lisboa!

 

Reconforto o olhar num pequeno éden de rosas vermelhas e cravinas. E há árvores por perto. No topo Norte, a gare confina com a passagem de nível, cruzada pelo trânsito domingueiro.

 

Retinido quase inaudível na plataforma anuncia comboio. As cancelas de um só braço baixam devagar. Os automobilistas mais afoitos, cosidos aos limites, arriscam a travessia. Nascido da curva, turbilhão de aço a ensurdecer a linha, a estremecer o chão, o Pendular para Lisboa.

 

Volvidos minutos, de novo as campainhas, as cancelas, a afoiteza dos carros domingueiros, e o sobressalto, o baque de outra bátega a varrer a gare. E de novo o silêncio.

 

«Viu?!», diz-me um sujeito do outro lado da linha, visão privilegiada sobre o trânsito. «Viu a carrinha?!» E agitado: «Atravessou com as cancelas a descer e o comboio veio logo. Um dia destes há aqui uma desgraça».

 

Transmito a inquietação ao revisor da composição em que enfim embarco. Ouve, aquieta-me: «A linha, as passagens, as estações... isto vai ser tudo mudado». «Breve?», inquiro. «Ah, sim. Já dentro de dois, três anos».


Augusto Baptista

 In Notícias Magazine n.º 523 - 2 de Junho de 2002

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