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repórter
10 août 2007

A variante

 

 Tudo começa com um pequeno sobressalto no passeio: uma pedrita que salta. Saltando, se abriu uma ausência, a breve falha dum dente, no pavimento. O conflito entre os pés dos transeuntes e a covinha cria novos sobressaltos, saltitos, maiores ausências.

 

 Quando o passeio se desdentou de todo, o chão subjacente breve se desfez num oco, se abriu numa ameaça, goela voraz de pernas partidas, mãos, braços. Num necrotério.

 

 Só numa manhã, conta-se, foi engolida uma jovem, o carrinho do bebé, pereceu o cobrador de custas judiciais. A dona Arminda e o senhor Serafim, respeitadíssimos, distraídos a conversar, animaram os noticiários. O senhor Estêvão da drogaria, a saudosa Leonor do café... E outros, tantos que seria fastidioso enumerar.

 

 A abnegação dos bombeiros, as infrutíferas escavações, as acções de busca e salvamento nas profundezas, com cães-polícia vindos expressamente da Austrália, mais escancararam o apetite, as maxilas da devoração. E quando o oco sinistro, a pança, enfim abarrotava, já a cidade definhava em gente, em movimento.

 

 Chorado o último residente, as autoridades decidiram pôr pedra sobre o assunto. Com carácter de urgência, foram descarregados oportunos pedregulhos, camiões de cascalho e brita. Tudo bem compactado, recobriram o local de má memória com asfalto.

 

 Por extenso.

 Em tempo recorde, como sublinharam os jornais, foi ali inaugurada uma moderna via rápida, uma nova variante. 


Augusto Baptista


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