Canalblog
Editer l'article Suivre ce blog Administration + Créer mon blog
Publicité
repórter
3 octobre 2006

Os reis da bicharada


Pequenos ou mesmo minúsculos em tamanho, gigantes em número e em idade, campeões no jogo do disfarce e do ardil, mestres na arte da sobrevivência, os insectos são os verdadeiros senhores do planeta. Cigarras, grilos, ralos, eles sim — muito mais provavelmente do que nós — serão naturais protagonistas nos distantes amanhãs que cantam.

Texto de Augusto Baptista

 

Muito difundida é a ideia de que a bicharada animal já foi toda ela descoberta. Apesar deste muito generalizado entendimento, as coisas não são bem assim. Para avaliar a expressão do erro, ajuda uma visita ao Insectário da Quinta de Santo Inácio, em Avintes.

Aí, logo à entrada, painéis avantajados e coloridos lançam intrigantes revelações: «Os primeiros insectos evoluíram há cerca de 400 milhões de anos, mas diversificaram-se de tal forma que hoje estão já identificadas cerca de 1 milhão de espécies, suspeitando-se que existam outros 4 milhões por identificar».

Quatro milhões!

Quando se passa da noção de espécie para o patamar zoológico constituído pelo indivíduo, pela unidade animal, estes quantitativos serão dramaticamente potenciados. O gigantismo dos números exprime a nossa ignorância sobre o planeta, sobre o mundo animal, sobre o «mais numeroso e bem sucedido grupo de seres vivos» e que constituem «mais de 56% do total de espécies existentes na terra».

As revelações sobre estes senhores do planeta não cessam, numa escala que impressiona: «Todos os anos, cerca de 20% das culturas agrícolas para consumo humano são na verdade consumidas pelos insectos herbívoros». E logo: «Um enxame de gafanhotos do deserto pode possuir mais de 50 biliões de animais e consumir perto de 100 mil toneladas de plantas por dia».

Estes níveis de devastação podem fazer com que se responsabilizem os insectos pela fome no mundo e daí à necessidade de extermínio da classe vai um passo. Cuidado! «Os insectos são cruciais e insubtituívéis nos ecosistemas naturais já que são responsáveis pela reciclagem dos nutrientes e polinização de milhares de plantas, pelo arejamento e fertilidade dos solos, como fonte de alimentação para muitas espécies selvagens».

A miudagem das escolas, em visita ao insectário, passa como gato por brasas por esta informação. «De um modo geral, as turmas entram, os professores dizem Meninos olhem os insectos, e sai tudo a correr. Não são transmitidos ensinamentos que permitam aprender a ver e despertem interesse pela Entomologia». O desalento é de Vitor Carvalho, criador do espaço e administrador do Parque.

Curiosamente, Vitor Carvalho, 40 anos, alentejano, não precisou que ninguém lhe instilasse a febre dos bichos. Desde criança, começou a interessar-se por cobras de água, rãs, insectos, inclinação preocupante para a família: «O miúdo é maluco, temos de o levar ao médico». Com ou sem assistência médica, aos 12 já tinha uma colecção de insectos e répteis. Mais tarde, no Luxemburgo, criava uma pequena empresa de jardinagem e, com os réditos da actividade, voava na paixão: «À noite só me dedicava a recolher espécies. Corria todos os países da Europa à pergunta de insectos, de répteis». E assim foi conhecendo pessoas e bichos. E quando, há cerca de três anos, respondeu ao desafio de criar um parque zoológico em Avintes, concretizou-se um sonho: «Aqui, com os meus animais, sou feliz».

O insectário é a menina dos olhos de Vitor Carvalho, roteiro das suas deambulações pelo mundo. Há aqui animais vindos dos confins, e não só insectos: há aranhas (classe dos aracnídeos), miriápodes. Em compensação, as borboletas — sendo insectos — não habitam este espaço e dão corpo a uma unidade independente: o borboletário. 

Alguma da bicharada exótica, alojada no interior de inúmeros terrários aquecidos e envidraçados, foi capturada por Vitor Carvalho. Entre os insectos mais esquisitos sobressaem, até pela quantidade, os da estranha família dos bichos-pau, caçados na selva amazónica peruana. Para o efeito, com frequência Vitor lá se desloca e até comprou uma casa em Equitos, cidade implantada na nascente do Amazonas: «De manhã abro a janela do meu quarto e deslumbro-me com a biodiversidade, com os golfinhos cor-de-rosa a brincarem no rio».

Em Equitos, antes que o calor aperte, arranca para a selva: «As capturas são feitas de dia, até às onze da manhã e depois das 5 da tarde. Escolho o local, fico à espera. Às vezes horas, atento ao mínimo sinal. Alguns estão agarrados aos troncos, outros às folhas, são castanhos, verdes. Os insectos-pau são como as pessoas: todos iguais, todos diferentes».

Mesmo no insectário de Avintes, é difícil descobrir esta espécie animal, tais os recursos e manhas miméticas, tanta a desatenção dos visitantes. «Muitos entram, dão a volta, e só vêem silvas e paus. O português não está habituado a observar, a perder tempo. Só sabe ver o elefante», desabafa Vitor

Em compensação, há quem se perca no insectário, aqui passe horas. Tantas quantas na Malásia serão necessárias para detectar o insecto-pau gigante, animal a atingir meio metro de comprimento com as patas distendidas, e que se assemelha a um comprido e seco ranco vegetal.

De demorada detecção é também o insecto-folha, animal de forma foliculada e com desenhos no corpo que imitam as nervuras e os recortes das folhagens onde se abriga. Certas espécies, pasme-se! emitem até leves rumores, a sugerir o sussurro das folhas tocadas pela brisa. O insecto-palha, da mesma ordem animal, é outro campeão do disfarce, assumindo formas que lembram caulículos desagregados, ervas secas, gravetos poídos.

Aspecto de um fragmento vegetal, seco, com picos urticantes, tem o insecto-pau espinhoso. A cauda, recurvada sobre o dorso, sugere temível escorpião. Já o insecto-pau estriado junta aos recursos miméticos expedientes venenosos a sério. É um exemplar que Vitor conhece bem no seu habitat, a selva peruana: lugar de fascínio. E de medo. «Gosto muito de animais, gosto muito da selva, mas tenho de ter sempre um pé atrás». Interprete-se: Vitor recusa dormir no mato. Aflige-o a escura proximidade com ferocíssimos jaguares, com silenciosas serpentes. «Ver os programas de televisão é uma coisa; agora estar lá, é outra. Ademais no Peru, onde há povos que ainda praticam o canibalismo».

Esconjurando tais extremos, mesmo os tradicionais hábitos alimentares desta região amazónica o confundem. Mandioca, saladas fibrosas, carne de tartaruga, bebidas fermentadas na boca, tudo lhe mete impressão — embora tire partido de algumas facetas da gastronomia local.

«Em Equitos comem larvas de Megasoma, uma carocha grande. Fazem espetadas num pauzinho, metem no lume, dão uma passadela e... Dizem que sabe a queijo. Chamam-lhes ussuri». Sem que alguma vez tal provasse, é um assíduo cliente da iguaria: «Habitualmente há uma senhora a vender e eu, em vez de andar a capturar esta espécie, chego lá, compro».

Sob a alçada do Instituto de Conservação da Natureza do Peru está uma outra espécie de Cetónia, a Dynastes. «Outrora, chegaram a ir para o Japão cinco a seis mil por semana, só machos». Hoje, esta carocha colorida, cabeça amarela e muito apreciada pelos coleccionadores, está em extinção, «o que não desarma o comércio ilegal, sobretudo para o Japão, e inflaciona os preços».

Entre os japoneses, um dos hobbies é organizar concursos de insectos, particularmente de Megasomas: «O corpo tem 12 cm de comprimento e seis de largura. É um dos insectos que mais força tem nas patas». Corpulência e força são atributos medidos e confrontados entre os donos das carochas. «Os japoneses são loucos e pagam fortunas. Um destes últimos anos, houve lá um leilão com Megasomas vivos e o exemplar maior e mais pesado atingiu 16 mil dólares».

Também na Europa, reina a paixão pelos insectos. Na França, há um clube com cerca de seis mil sócios e, na Alemanha, um outro tem 55 mil. Na Suiça, Polónia. Itália, todos os domingos há exposições, encontros, trocas de insectos, vivos e mortos — estes os mais cotados entre coleccionadores. Mas a opção não agrada a Vitor: «Gosto de tudo quanto seja vivo. Animais embalsamados, sou contra. Tenho de respeitar as ideias dos outros, mas o meu objectivo é preservar e reproduzir».

A perdição dos estrangeiros pela bicharada de seis patas intriga as gentes peruanas. «Lá como cá, insecto é para matar». Conta uma história. Uma vez, em Lima, no Hotel Ariosto, onde Vitor se costuma alojar, uma empregada de quarto, nova na função e desconhecedora das inclinações do cliente, coscuvilhou-lhe caixinhas e frascos, com preciosos espécimes. Alguns soltaram-se, vaguearam pelo quarto. Prestimosa, a empregada encheu a banheira com água a ferver, afogou tudo. «Quando o gerente me veio contar, eu só me ria. Que podia eu fazer?!».

Com idêntica gargalhada, reagiu à notícia, transmitida por um furibundo responsável do aeroporto de Frankfurt, de que, por sua causa, o voo para Portugal fora cancelado: a aeronave estava inçado de insectos, empestada de carochas voadoras, contaminada por estranhas criaturas formigantes, insidiosa multidão a pôr em risco a segurança, em pânico a tripulação, os passageiros! «Eu tinha as autorizações todas de saída, de transporte, tudo em ordem. Mas o curioso que levou a bagagem, deu-lhe para espreitar. Como as caixinhas são opacas, foi abrindo... Passadas quatro horas, ainda andava eu no porão, à caça».

De outra vez, em Equitos, depois de uma captura na selva, foi para o hotel. Como estava muito calor, caixas e frascos onde guardava larvas e terra começaram ressuar. E resolveu destapar tudo. Operação concluída, adormeceu. De madrugada, hotel em polvorosa: «Tum! Tum! Tum! Tudo infestado. O que eu julgava ser terra, afinal eram larvas de formigas. Milhares! O lençol da minha cama parecia um dálmata».

Insectos são criaturas que nos podem levar longe, ou trazer para perto; que nos podem levar a ouvir, ou a contar: era eu menino, no faval do meu quinteiro apareciam joaninhas. Estendia-lhes a mão, correspondiam.

 

Joaninha avoa avoa

que o teu pai está em Lisboa

com uma faca de latão

pra matar o capitão

zzzzz

Grande insectário é o mundo!

 

Os artrópodes

Um dos maiores desafios colocados ao Homem foi (e é) o de conhecer e caracterizar cada unidade animal para, a partir dos casos particulares, poder elaborar classificações, ordenamentos, formular conjuntos, universos cada vez mais dilatados e abrangentes.

Através do labor de sistematização zoológica, se chegou à definição de grupos principais ou filos do reino animal, de que é exemplo o dos Cordados-vertebrados, integrando as classes dos Ciclóstomos, dos Peixes, dos Batráquios, dos Répeis, das Aves, dos Mamíferos. Depois, dentro destas classes, há ordens, há famílias, há espécies, indivíduos.

No mesmo patamar classificativo dos Cordados-vertebrados, temos o filo dos Artrópodes, invertebrados com patas articuladas e subdivididos, conforme o número de patas, nas seguintes classes: Insectos (seis patas, ex: mosca), Aracnídeos (oito patas, ex: aranha), Crustáceos (10 patas, ex: camarão), Miriápodes (um ou dois pares de patas por segmento, ex: centopeia).

Os insectos são assim artrópodes com seis patas, frequentemente com um ou dois pares de asas, e todos — sejam borboletas, baratas, joaninhas, mosquitos, bichos-pau — com o corpo subdividido em cabeça, tórax e abdómen. Tal como os mamíferos e outras classes animais, os insectos subdividem-se em ordens: à volta de 30, no caso. As ordens subdividem-se em famílias, estas em espécies, que englobam os indivíduos.

São exemplo de ordens em que se subdividem os insectos: os Dípteros (ordem com 130 famílias e mais de 122 mil espécies identificadas, ex: mosquitos e moscas), os Lepidópteros (com 127 famílias e mais de 165 mil espécies identificadas, ex: borboletas e traças), os Himenópteros (com 91 familias e mais de 198 mil espécies identificadas, ex: abelhas, vespas, formigas), os Coleópteros (com 166 famílias e mais de 360 mil espécies identificadas, ex: carochas, escaravelhos, joaninhas), os Blatários (com seis famílias e cerca de 4 mil espécies identificadas, ex: baratas), os Mantódeos (cerca de 2 mil espécies identificadas, ex: louva-a-deus), os Ortópteros (cerca de 28 famílias e cerca de 20 mil espécies identificadas, ex: grilos, gafanhotos), os Fasmópteros (ordem com três famílias e cerca de 2500 espécies identificadas, ex: bichos-pau, insectos-folha).

Nos insectos, o número de espécies identificadas remete para valores da ordem de um milhão, estimando-se em 4 milhões as espécies ainda por identificar. O gigantismo dos números diz do trabalho que espera os cientistas, especialmente entomólogos.

 

 

1 Esta reportagem, com o caixilho Os artrópodes, foi publicada na revista Notícias Magazine n.º 553 – 11 de Agosto 2002.

Publicité
Commentaires
T
Interesante el mundo de los insectos eh!<br /> Hay una invitación para visitar mi espacio donde hay muchas fotos de insectos acuáticos (escarabajos, libélulas, moscas, efemerópteros, tricopteros, chinches, etc. ) que yo mismo colecte y fotografié en la selva de los Tuxtlas, Veracruz, México. Ojala y les agraden, soy biólogo-taxónomo y espero hacer mas amigos que les agrade la entomología.<br /> La direccion es http://antoniobichoacuatico.spaces.live.com<br /> Muchos saludos y hasta pronto<br /> Toño
Publicité
Archives
Derniers commentaires
Publicité